O Conselho Nacional de Justiça está discutindo uma nova questão surgida das uniões entre pessoas: o poliamor, ou seja, a possibilidade de se legalizar a união estável envolvendo mais de duas pessoas. Com o julgamento, o CNJ deve orientar os cartórios sobre o comportamento diante de uma solicitação desse tipo, com pedidos de reconhecimento familiar por famílias que sejam compostas por três ou mais pessoas.
As entidades ligadas ao Direito de Família, no entanto, se manifestam de forma contrária à autorização de uma família a partir da união estável de poliafetivos, considerando que a condição inconstitucional, uma vez que a própria Constituição e o Código Civil entendem que “união estável como casal é aquela formada por homem e mulher”, alegando ainda o fato que o Supremo Tribunal Federal, em 2011, referendou essa condição.
Além dos possíveis problemas decorrentes de divisão de bens e outros jurídicos, as entidades também consideram que a poligamia está indo contra os bons costumes da sociedade brasileira. No entanto, o Instituto Brasileiro de Direito de Família defende que o Estado não deve interferir em relações afetivas entre as pessoas. Para o IBDFAM, a união estável seria uma forma de reconhecimento dos direitos dos integrantes desse novo modelo familiar.
Acusações entre representantes de entidades
De acordo com o IBDFAM, a proibição da união poliafetiva é decorrente de uma visão ultraconservadora. Para a entidade, a maior questão que, certamente, incomoda as entidades de defesa da família é o fato de colocar a monogamia em cheque. A entidade considera que o Estado não deve interferir e que o Direito, através dos tempos, sempre ofereceu legitimidade a relações já existentes. Como se trata de algo que está exigindo atenção, é de interesse do Direito que o denominado poliamor seja legalizado.
A Associação de Direito de Família e das Sucessões, no entanto, considera que a união poliafetiva, diferentemente da união homoafetiva, não é aceita pela sociedade. Os casais homoafetivos, segundo a ADFAS, passaram a ser parte dos costumes, dentro de um princípio monogâmico e, segundo esse entendimento, o Direito ainda precisa acompanhar os bons costumes. Além disso, a monogamia é uma norma de relacionamento em países com altos índices de desenvolvimento. Segundo a entidade, os piores índices de desenvolvimento humano ocorrem exatamente nos países que permitem a poligamia, com na África e no Oriente Médio. A entidade ainda manifestou sua preocupação com a partilha de pensões previdenciárias e com a divisão de contrato em associações, condições que, de acordo com o IBDFAM, seriam problemas a serem resolvidos por advogados. Segundo a IBDFAM, proibir os cartórios de reconhecerem juridicamente uma união poliafetiva seria afrontar os princípios da liberdade, da igualdade e da não intervenção estatal na vida privada.
O Conselho Nacional de Justiça, no entanto, não chegou ainda a um consenso. Para o Ministério Público, os cartórios podem reconhecer a união poliafetiva, desde que seja a vontade das pessoas. Para o MP, o conceito de família evoluiu e, hoje, impedir uma união poliafetiva seria o mesmo que impedir uma união homoafetiva, como ocorria há alguns anos.
A poligamia não é algo novo na história, sendo praticada desde a antiguidade. Dessa forma, o seu reconhecimento pelo CNJ seria tratar o caso com menor dose de hipocrisia, deixando de enxergar algo que já acontece na sociedade, mesmo não sendo tão comum. A polêmica deve continuar. Embora o CNJ esteja já votando sobre o assunto, ainda existem muitos questionamentos que devem ser resolvidos e, certamente, mesmo que a sentença seja sobre a aceitação da poligamia, ou poliamor, haverá ainda muito chão a percorrer até que a condição seja aceita pela maior parte da sociedade.